quinta-feira, 26 de julho de 2012

CORINGA SALVA BATMAN!

Atuação de Heath Ledger é o único destaque de mais uma decepcionante produção sobre o Cavaleiro das Trevas.



(Texto produzido em exercício de análise crítica de filme da disciplina Redação para Audiovisual, Jornalismo - Uniceub)

            Escrito e dirigido por Christopher Nolan, Batman – O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight, 2008) começou errando pelo título, que remete à clássica produção em quadrinhos de Frank Miller, dos anos 80, sem contudo lhe fazer referência em termos de enredo, arte ou brilho.
            A história deste segundo filme da nova série do homem-morcego tem como base o enredo de outro quadrinho, Batman: O Longo dia das Bruxas, e coloca em evidência a questão da “ilegalidade” da atuação dos heróis, que juridicamente agem tal qual os vilões: sem a legitimidade do uso da violência, cuja exclusividade foi assumida pelo Estado, ao longo da história. Batman, interpretado por Christian Bale, percebe-se amarrado na luta contra o crime, e aproxima-se dos representantes da lei, o comissário de polícia Jim Gordon e o promotor de justiça Harvey Dent. É nesse contexto que aparece o misterioso Coringa, na brilhantemente psicótica interpretação de Heath Ledger, anunciando-se como agente do caos e colocando em cheque os métodos do homem-morcego.
            A partir deste cenário começa um thriller alucinante, cheio de ação e reviravoltas entre os diversos personagens e situações – o que a princípio seria motivo de elogios e comentários positivos. Ocorre que isso se dá de uma forma meio “atropelante”, isto é, em velocidade e ritmos tais que o espectador mal acaba de se dar conta de uma situação, uma cena, e lá vem outra “encavalada”. Isso faz passar despercebido, ou sem questionamentos, relações de causa e efeito um tanto quanto implausíveis de algumas sequências – como quando o Batman é enganado pelo Coringa na tentativa de assassinato do prefeito, mas que aparentemente estava tramando junto com o comissário e o promotor para prender o vilão, que por sua vez mostrou que tinha forjado a própria prisão para dar prosseguimento a uma guerra psicológica com o herói, mesmo tendo acabado de tentar matá-lo em uma perseguição com direito a caminhão e lança-mísseis. E isso foi apenas um resumo.
            Outro grande problema por excesso de velocidade é exemplificado na cena de combate final ao Coringa. Batman entra em um prédio abandonado munido de óculos com visão noturna, e sai à caça do vilão e dos capangas. Na tentativa de reproduzir a sensação de ação e tensão sofrida pelo herói, o diretor abusa do plano subjetivo, com rotações de câmera frenéticas, tanto no eixo horizontal quanto no vertical, entremeadas de planos médios, muito escuros, deixando o espectador tonto e sem referência da cena.
            Outros defeitos remanescem do primeiro filme e envolvem a produção visual e artística na caracterização dos personagens e do ambiente. O cenário e o figurino são pós-modernos e tecnológicos demais. Gotham City não é nada gótica. O Batman mais parece um exterminador do futuro, e inexplicavelmente tem um tom de voz diabólico. O batmóvel é um tanque de guerra, e não um automóvel. Há excesso de cenas diurnas para um filme em que o cavaleiro se diz das trevas. Impossível evitar a comparação com o Batman de 1989, de Tim Burton: mais sombrio, gótico e noir.
A escolha de alguns atores para representar personagens importantes também é equivocada nessa perspectiva da caracterização. Jim Gordon deveria ser alguém mais robusto e imponente do que o esguio Gary Oldman. Bruce Wayne e Batman não poderiam ter o problema na arcada dentária superior que tem o Christian Bale, nem aspecto tão jovial. Irretocável e surpreendente, só mesmo o Coringa feito por Heath Ledger, o que lhe rendeu o Oscar póstumo de melhor ator coadjuvante.
O cinema já mostrou em Sin City – A Cidade do Pecado (2005), que é possível reproduzir com qualidade uma obra originalmente feita em quadrinhos. Por tratar-se de uma adaptação, o diretor Christopher Nolan deveria primar por uma aproximação e fidelidade maior aos gibis, de onde afinal vem o sucesso do homem-morcego, desde 1939.