Atuação
de Heath Ledger é o único destaque de mais uma decepcionante produção sobre o
Cavaleiro das Trevas.
(Texto produzido em exercício de análise crítica de filme da disciplina Redação para Audiovisual, Jornalismo - Uniceub)
Escrito e dirigido por Christopher
Nolan, Batman – O Cavaleiro das Trevas
(The Dark Knight, 2008) começou errando pelo título, que remete à clássica
produção em quadrinhos de Frank Miller, dos anos 80, sem contudo lhe fazer referência
em termos de enredo, arte ou brilho.
A história deste segundo filme da
nova série do homem-morcego tem como base o enredo de outro quadrinho, Batman: O Longo dia das Bruxas, e coloca
em evidência a questão da “ilegalidade” da atuação dos heróis, que
juridicamente agem tal qual os vilões: sem a legitimidade do uso da violência,
cuja exclusividade foi assumida pelo Estado, ao longo da história. Batman,
interpretado por Christian Bale, percebe-se amarrado na luta contra o crime, e
aproxima-se dos representantes da lei, o comissário de polícia Jim Gordon e o
promotor de justiça Harvey Dent. É nesse contexto que aparece o misterioso Coringa,
na brilhantemente psicótica interpretação de Heath Ledger, anunciando-se como
agente do caos e colocando em cheque os métodos do homem-morcego.
A partir deste cenário começa um thriller alucinante, cheio de ação e reviravoltas
entre os diversos personagens e situações – o que a princípio seria motivo de
elogios e comentários positivos. Ocorre que isso se dá de uma forma meio
“atropelante”, isto é, em velocidade e ritmos tais que o espectador mal acaba
de se dar conta de uma situação, uma cena, e lá vem outra “encavalada”. Isso
faz passar despercebido, ou sem questionamentos, relações de causa e efeito um
tanto quanto implausíveis de algumas sequências – como quando o Batman é
enganado pelo Coringa na tentativa de assassinato do prefeito, mas que aparentemente
estava tramando junto com o comissário e o promotor para prender o vilão, que
por sua vez mostrou que tinha forjado a própria prisão para dar prosseguimento
a uma guerra psicológica com o herói, mesmo tendo acabado de tentar matá-lo em
uma perseguição com direito a caminhão e lança-mísseis. E isso foi apenas um
resumo.
Outro grande problema por excesso de
velocidade é exemplificado na cena de combate final ao Coringa. Batman entra em
um prédio abandonado munido de óculos com visão noturna, e sai à caça do vilão
e dos capangas. Na tentativa de reproduzir a sensação de ação e tensão sofrida
pelo herói, o diretor abusa do plano subjetivo, com rotações de câmera
frenéticas, tanto no eixo horizontal quanto no vertical, entremeadas de planos
médios, muito escuros, deixando o espectador tonto e sem referência da
cena.
Outros defeitos remanescem do
primeiro filme e envolvem a produção visual e artística na caracterização dos
personagens e do ambiente. O cenário e o figurino são pós-modernos e
tecnológicos demais. Gotham City não é nada gótica. O Batman mais parece um
exterminador do futuro, e inexplicavelmente tem um tom de voz diabólico. O
batmóvel é um tanque de guerra, e não um automóvel. Há excesso de cenas diurnas
para um filme em que o cavaleiro se diz das trevas. Impossível evitar a
comparação com o Batman de 1989, de Tim Burton: mais sombrio, gótico e noir.
A
escolha de alguns atores para representar personagens importantes também é
equivocada nessa perspectiva da caracterização. Jim Gordon deveria ser alguém
mais robusto e imponente do que o esguio Gary Oldman. Bruce Wayne e Batman não
poderiam ter o problema na arcada dentária superior que tem o Christian Bale,
nem aspecto tão jovial. Irretocável e surpreendente, só mesmo o Coringa feito
por Heath Ledger, o que lhe rendeu o Oscar póstumo de melhor ator coadjuvante.
O
cinema já mostrou em Sin City – A Cidade do Pecado (2005), que é possível
reproduzir com qualidade uma obra originalmente feita em quadrinhos. Por
tratar-se de uma adaptação, o diretor Christopher Nolan deveria primar por uma
aproximação e fidelidade maior aos gibis, de onde afinal vem o sucesso do homem-morcego,
desde 1939.