Por Rodrigo Caetano
O
fato do cão ter um nome, o fato do cão se chamar Romeu, é um ponto fundamental.
Romeu não é apenas um cão. Tudo aquilo que ganha identidade deixa de ser
matéria e se tornar substância. Romeu não é apenas um cão. É o cão de Catarina.
Ou melhor, é o Romeu de Catarina. Sendo assim, eles passam a ter
um-para-o-outro maneirismos e singularidades só perceptíveis àqueles olhos.
A
cena é rápida. Catarina conduz Romeu pela coleira. Sons habituais. Palavras
entrecruzadas. Romeu!, Ela ex-clama. A pele seca. Um carro passa. 16h2min.
Romeu corre. Barulho de freada. Romeu. Carro. Comercial. Catarina chorano. O
pai corre. Enquanto o pai retira Romeu do algoz, transeuntes acodem Catarina.
Ela é o puro desgosto.
Em
geral, acostumasse com o que é frequente em nossas vidas. Enfermeiras são
acostumadas com a dor alheia. É uma espécie de autoproteção inclusive. Mas a
dor genuína das primeiras cicatrizes reverbera, contagia. Não havia quem não
parasse para acudir Catarina. A experiência da morte é sempre brutal. Brutal
pela sua inevitabilidade e por sua necessidade. Sem ela, sem a consciência da
morte, a vida seria vazia de sentido. Basta nos perguntarmos agora se
estaríamos fazendo o que estamos fazeno caso fossemos eternos? Se não houvesse
a morte e todos fossemos uma espécie de Highlander, estaríamos fazendo nesse
momento o que estamos fazendo? E mais: faríamos o que estamos fazendo em algum
momento de nossa vasta eternidade? Todos sabemos a resposta. A morte é brutal.
Irreversível e necessária. Catarina chora a perda e sensivelmente compreende o
valor que ela tem. Toda criança que experiencializa a morte se adultiza e passa
a carregar uma idade que não tinha.