quarta-feira, 2 de outubro de 2013

COM QUANTAS ROUPAS EU VOU? - Estudando o próprio consumismo. Parte 1: Moda


“Olá, meu nome é Sérgio, tenho 28 anos e 157 itens de roupas.” Em estudo estatístico simples no guarda-roupa lá de casa, constatei que uso apenas 14,01% do vestuário adquirido. A porcentagem foi alcançada com base em (super)estimativa do que visto durante uma semana normal de vida-corrida-moderna-capitalista-ocidental-cristã. Então incluí no cálculo a indumentária necessária para realizar atividades como trabalho, lazer, prática de esportes, etc. Mas se considerarmos o uso real, com base apenas no que levo de fato de roupa suja pra lavar, chegaremos a uma taxa de mais ou menos 9% do total por semana.

A princípio, um absurdo revelador do meu consumismo. Mas os números devem ser esmiuçados para que possamos compreender melhor a situação, ou pelo menos, para que eu não me sinta tão culpado ou vitimado pela sociedade industrial. Tentarei explicar os dados conforme hábitos, histórias de vida e idiossincrasias. Antes de começar a análise, aviso que deixei cuecas e meias de fora da amostra, roupas íntimas demais para exposição mundial (uma pena, aliás. Elas poderiam me salvar desse rótulo consumista: uso meias encardidas e cuecas furadas sempre que elas aparecem limpas na gaveta).

Tapando em cima


A parte superior do corpo é onde aperta o calo do desperdício. Camisetas e camisas totalizam incríveis 99 itens nos cabides, e representam 63% do guarda-roupa. Uso, por semana, de 9 a 12 itens – ou seja, cerca de 10% do que tenho para cobrir peito, barriga, costas e braços.

(Aqui, um grande parênteses. Tenho 33 camisetas de times de futebol que fazem parte de uma coleção iniciada na Copa de 1998 com um uniforme do Brasil. De lá pra cá gostei desse troço e viciei em comprar camisas oficiais de clubes e seleções. Já doei algumas, me furtaram outras, e ainda sim tenho esse monte para contabilizar. Como estamos tratando de consumismo, não poderia deixar de fora esse fetiche do consumo de que se traveste o ato de colecionar. Uso apenas 2 por semana, e olhe lá!)

Ainda sobre as peças de cima, tenho alguns números absolutos interessantes e desoladores. Por exemplo, tenho sorte de não ser obrigado a usar camisa social no serviço. Logo, prefiro deixar inutilizadas as 17 camisas de manga longa que possuo. Elas são muito quentes e dão mais trabalho para vestir (botões são um atraso de vida). Pelo mesmo motivo do temor ao calor, só tenho 1 camisa-pólo, filada de um primo, e ainda assim não a uso.

Embora já tenha feito vários “limpas” para doações, camisetas insistem em permanecer no guarda-roupa, por motivos diversos. Tem aquela esperando você (eu) emagrecer. Tem uma camiseta preta à espera de um show de rock. Tem aquela ridícula que você (eu) pretende usar no carnaval ou numa festa à fantasia. Tem umas que já foram surradas, batidas, lavadas, desbotadas, mas foi sua mãe ou sua vó quem te deu, e lá permanecem – no meu caso, são reaproveitas virando pijama.

Tapando embaixo

Shorts, bermudas, calça jeans e calça social somam 33 peças no meu guarda-roupa. Aqui também tenho muito, e uso pouco. Três a cinco shorts por semana, do total de 15 (taxa de utilização de 33%). Tudo depende da ida à academia ou ao parque próximo. Tento reaproveitar os que não ficam muito sujos ou suados para jogar futebol ou correr. Shorts velhos (alguns com mais de 15 anos) também substituem meu único pijama na maior parte das noites.

Quanto às calças, uso no máximo duas por semana. Não as 2 sociais que tenho, e sim 2 das 7 jeans que revezo para ir ao trabalho e também sair. Nesse caso, mesmo usando pouco (tx. de 28% do total/ semana) prolongo o tempo útil delas antes de voltarem pra máquina de lavar. Com o revezamento, elas demoram umas três ou quatro semanas sem gastar água e sabão do mundo.

Calçados

Nesse quesito já tenho os “pés no chão”. São 12 pares de calçados para os diversos tipos de situação/ ocasião/ piso. Enumeremos: 1 sapato social; 1 sandália; 1 chinelo; 2 tênis de corrida (é preciso revezar para não desgastar o amortecimento); 3 chuteiras (uma para o gramado, outra para o concreto liso, outra para o “asfalto granulado” onde às vezes jogamos futebol).

Só não são usados plenamente os 4 pares de sapatênis, porque acabei tendo preferência pelos 2 mais confortáveis. Ainda assim, a taxa de utilização de todos os meus calçados fica próxima de 50% por semana, sendo que a outra metade fica à espera da situação específica para ser pisado. (nesse ponto estou muito curioso para comparar com você, leitorA, apenas o número total de sapatos =)


Combate ao frio

Na moda outono-inverno acho que faço o “não-uso” mais racional dos recursos. Contabilizei somente 7 peças ao todo, incluindo 3 blusas de moletom, 1 calça, 2 jaquetas e 1 gorro andino. Em condições normais de Brasil tropical, não uso qualquer uma, mesmo no inverno. Levo no banco traseiro do carro uma dessas blusas de frio, em caso de baixa repentina na temperatura – mas quem usa, 100% das vezes, é minha namorada.

Extras

Ainda tenho um terno que nunca uso, mas que orgulho de ser o único que comprei em toda minha vida. Duas sungas à espera das férias, do verão ou de um convite pra piscina. E por último, o mais desnecessário e aristocrático dos itens da indumentária humana: o roupão. Uma peça que parece toalha mas não te seca, e cuja utilidade está restrita aos poucos segundos que te separam do fim do banho ao momento em que você resolve se enxugar plenamente.

8 comentários:

Sérgio Bertoldi disse...

Uma análise importante e interessante seria contabilizar e separar o que tenho no guarda-roupa que eu mesmo comprei, ou que ganhei.

No entanto, não tenho esses dados, não consigo lembrar o que foi que comprei ou ganhei.

Outro detalhe interessante seria contar quanto tempo cada item está lá. No fundo, acredito que meu desperdício vem do acúmulo, do não desapego. Ganho roupas novas, mas não desfaço das antigas.

Anônimo disse...

Sérgio, eu tenho medo de fazer uma contabilidade dessas no meu armário. Primeiro porque é uma bagunça de fazer desmaiar vó. Depois porque minhas angústias consumistas não me impedem de cair em tentação frente ao canto da sereia da indústria da moda, e meu guarda-roupa que está, literalmente, explodindo, é prova disso. Outro dia eu reparei que uma das minhas gavetas está quebrando - muito peso. Resolvi que o melhor método de lidar com isso era recalcando a informação. Tenho tantas angústias quanto a consumo que estou repensando voltar pra terapia, honestamente.
- Amanda

Sérgio Cozzetti disse...

Serginho, o senhor esqueceu de contabilizar as roupas e calçados que esqueceu lá em casa. Acho que são quatro camisetas, uma calça jeans preta, alguns pares de tênis e meia de futebol. Se você já contabilizou como doação, vou tratar de dar um rumo nesses itens... kkkkkkkkkkkkkkkkkk
Parabéns pelo texto!

Bruno Cameschi disse...

Muito legal. Nossas roupas, livros e discos são traços importantes de nossa personalidade.

Quanto a roupas, eu sou mais ou menos como você: tenho dificuldades de descartá-las. Exceção feita às camisetas básicas (de 15,90 ou 19,90). Essas eu descarto a cada seis meses e faço a reposição. Eu gosto delas, mas elas são muito vagabundas hoje em dia. Tive que aprender a lidar com elas para não andar que nem um mulambo na rua e ao mesmo tempo continuar fazendo uso delas.

Abraço!

Gabriel Massote disse...

Dessas 33, lembro de uma do vaixco e uma da França, ambas de 1998. Aliás, você ainda torce contra nossa seleção canarinho, a exemplo de Fernando, o Feio? Ótimo texto!

Sérgio Bertoldi disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Sérgio Bertoldi disse...

Amanda. Tente fazer. Os números dão um tapa na nossa cara, e a gente acaba acordando.

Pai. Os tênis já recuperei e já separei pra doação.

Bruno. É verdade. É bom comprar roupas novas. Precisamos estar em dia com a aparência, etc. Mas tem q ser nesse esquema mesmo. Substituição.

Gabriel Salsicha Massote Pereira. Relembrando, a camisa do Brasil eu joguei fora (ela foi se acabando) descobri que era falsificada. Já a da França de 98 foi a primeira oficial mesmo. Tenho ela até hoje, e comprei outra branca. Aquela do Vasxco eu "perdi", acredita? Acho que me roubaram no processo de mudança daquele apartamento pra casa da minha vó. Fiquei sem 2 do Vasco.

chico macedo disse...

Ótima sacada, Sérgio.

Li um livro muito bom certa vez chamado "Simplique sua vida", que dedica um capítulo apenas a essa questão de vestuário/acumulação irracional.

Faço um esforço para tirar itens antigos com a chegada de novos, mas o acúmulo ainda é um mal.

Há uns oito anos doei grande parte da minha coleção de camisas do Cruzeiro (por volta de 20) num esforço de desapego. Me arrependo um pouco. Farão falta no museu 100 Anos de Glórias, com previsão de lançamento em 2021.

No mais, o mundo gostaria de vê-lo de roupão, charuto e champanhe num iate, como um dos personagens do Marcelo Adnet.

Abraço, Chico.