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Estátua equestre de Manuel Belgrano, em frente à Casa Rosada. |
Uma capital distinta por suas
avenidas largas e arquitetura de
encher os olhos. Até parece que estamos introduzindo nossa Brasília, mas a hermana Buenos Aires tem as mesmas
características básicas, e muito mais. Pela
maior idade (e pela influência européia), a cidade apresenta mais estilos
arquitetônicos, além do modernista: neoclássico, neogótico, art deco e art
nouveu. Também tem mais parques, praças, pessoas e problemas - como toda
capital.
Dos problemas eu me mantive
distante, como bom turista a aproveitar sua última semana de viagem. Se os vi,
foi pela janela da microbus – que me
trouxe (sozinho, e de graça!) pelos 35 km do aeroporto de Ezeiza até a
movimentada Rua Florida, onde me
hospedei. Favelas são parecidas em qualquer lugar mundo, e geralmente estão
(foram) afastadas o suficiente para não incomodar os visitantes.
Caminhar pra conhecer
O Hostel Florida é um albergue com
estrutura maior que os convencionais, afinal, foi instalado em um antigo hotel
na rua que lhe dá nome. Por isso mesmo tem aspecto menos “intimista”, maior
número de hóspedes, funcionários e até banheiro dentro dos quartos. No meu,
estavam hospedados mais um brasileiro e dois “alemão”: um professor
universitário da Áustria e um jovem loiro de óculos geek – o Harry Potter da
Alemanha.
Segui a mesma estratégia de
turismo feita em Santiago. Prévia de distâncias dos percursos no Google Maps;
caminhadas solitárias durante o dia; retorno, descanso e socialização à noite.
A diferença dessa vez é que soltei mais a “cordinha de segurança imaginária” que
marcava o caminho de volta pro hostel e fiz caminhos mais longos e irregulares.
Com o mapinha das principais ruas e avenidas no bolso da bermuda, pude
acrescentar destinos e atrações não previstas na programação original do dia. Deste
modo percorri trechos de até mais de 10 km por “rolezinho”.
Foi assim já no primeiro dia
quando fui até a Plaza de Mayo, onde
estão importantes prédios públicos, incluindo a Casa Rosada. Sabia que o Porto
Madero era próximo e desci até lá. Andei, conheci, fotografei. Olhei no relógio,
tinha tempo. Olhei no mapa de bolso, tinha uma reserva ecológica perto. Só uma
voltinha nesse parque à beira do Rio da Prata acrescentou uns 5 km na conta de
passos. Na volta, pensei: “Por que não subir pelo histórico bairro de San
Telmo?!”
La Bombonera
Tava tão “bicho solto” na cidade
que até ônibus eu arrisquei pegar. Fui ao Estádio La Bombonera assim, depois de
passar pelo motorista aborrecido que até velhinha xingou (e a deixou de fora do
buzu). Alertas sobre o perigo do bairro La Boca, mesmo de dia, me fizeram
apressar os passos pelas ruas desertas até chegar ao Estádio. Lá dentro curti o
museu e o gramado visto da área geral inferior que fica atrás de um dos gols.
Mas queria mais. Abri uma porta
não vigiada que separava outros setores e percorri um labirinto de escadas e
corredores nas entranhas do estádio até avistar uma luz que revelava o acesso
às famosas arquibancadas superiores. Subi lá “encimão”. Lá é tão alto e íngreme
que dá certa vertigem. Fiz fotos panorâmicas enquanto imaginava aquilo tudo lotado.
Depois custei a achar o caminho de volta, mas consegui sair do estádio rumo ao
colorido conjunto de casas de El Caminito.
Turistão não!
Tentei não ser vítima dos
programas “pega-turista” que existem em qualquer lugar. O mais óbvio do tipo,
em Buenos Aires, é o jantar com tango. Pra quê pagar caro numa chatice de
jantar para ver tango se a bela dança pode ser apreciada em locais públicos!?
Eu mesmo preferi dar gorjeta aos dançarinos que movimentaram a charmosa
Plaza Dorrego em San Telmo, enquanto
tomava uma ou duas cervejas por ali. Procurava seguir o que a população local
fazia, incluindo uma parada num café, livraria, ou até eventos públicos
inusitados como a corrida de kart num circuito montado em plena Avenida 9 de
Julho – onde fica o Obelisco.
Se tivesse que seguir um roteiro
tradicional, que fosse gratuito, como a visita ao cemitério da Recoleta. Ou que
fosse tradição minha, como ver jogo de futebol no estádio. Já que não tinha
mais rodadas do campeonato argentino para assistir de perto, o jeito foi
procurar bar especializado para acompanhar a final da Sulamericana. Bem na
região central encontrei o
Tierra de Héroes, decorado com relíquias assinadas por jogadores do mundo todo. No bar
temático, porém, o jogo que chamava a atenção e estava na maioria dos telões
era a final do campeonato colombiano – que lotou a casa de torcedores nativos
do
Millionarios.
Imprevistos
Quando fui conhecer os bosques de
Palermo, desci do ônibus na Plaza Italia e dei de cara com um Zoológico. Entrei,
por que não? Seria mais interessante percorrer os 1000m de distância até a
Avenida Libertador conhecendo animais do que vendo carros passar pela Avenida
Sarmiento. Só não esperava que o portão do outro lado estivesse fechado. Mas
valeu a pena ver de perto um urso polar, um condor, rinocerontes e tigres.
Já nos jardins e bosques, fui
surpreendido por uma chuva de verão que abalou minha
resistência ao uso dos guarda-chuvas. O aguaceiro caiu no exato instante em que eu estava longe de
qualquer abrigo, isolado por longas avenidas e árvores nada copeiras. Cheguei ensopado
no destino seguinte, o Museu de Arte Latinoamericano de Buenos Aires (MALBA). Sequei-me
com um pouco de papel toalha do toalete. Na saída, dei de cara com os atores
Wagner Moura e Wladimir Brichta descendo a escada rolante do museu. Fiz cada um
tirar foto do outro comigo, usando meu celular. Depois da tietagem fui apreciar
as obras de arte e sabem quem eu ainda encontrei? “O Abaporu”, de Tarsila do
Amaral.
Os pés inchados da pintura me
lembraram que ainda tinha muito para caminhar. Com o sol de volta pude
experimentar novos trajetos, conhecer novas praças, avenidas ou ruelas, sem nunca
me cansar de me encantar com a verdadeira obra de arte da capital argentina: a
riquíssima arquitetura disponível para contemplação gratuita em construções
públicas ou particulares, em cada passo da cidade.
Todas as fotos feitas com um celular Sony Xperia Arc, em dezembro de 2011